Caminhava em direção à saída, seguindo aquele enorme fluxo
de pessoas. Pensava no que estava indo fazer. Revisava mentalmente a lista de
seus afazeres naquele dia. Tentara lembrar-se do título do livro que desejava
comprar, sem sucesso, só lhe vinha à mente os livros acadêmicos que teria de
ler.
Andava com passos rápidos, não poderia se dar ao luxo de
caminhar lentamente em meio àquela multidão. O caminho era longo até a saída, e
não sabia ao certo se estaria chovendo. O murmurinho de vozes era grande, e o
som dos trens passando na plataforma ainda não haviam desaparecido.
Em certo momento pode ver onde as pessoas que entravam se
cruzavam com as que saíam. Uma pequena confusão se formava, e por segundos não
saberia dizer para onde deveria ir.
Foi ali, em meio a essa confusão que viu passar aquele
rosto. Tentou se lembrar de onde o conhecia, pensou em falar-lhe, mas ao virar,
viu-se atrapalhando o trânsito. E pior, viu que o rosto havia desaparecido,
misturando-se à massa de máscaras que se aglomerava na escada de embarque.
Continuou andando. Sem pressa agora. Não se importava com o
trânsito que lhe seguia. Tentou ajeitar-se naquela confusão, continuou a andar
quase junto à parede, onde não atrapalharia tanto.
Caminhou lentamente, viu passar por ali dezenas de pessoas,
com as mais variadas características, mas aquele rosto não saía de sua mente.
Máscaras passaram, e o rosto permaneceu, apenas um rosto.
Pensou um tanto mais, até se lembrar, finalmente, onde o
havia visto pela primeira vez. Lhe veio à mente então aquele dia gelado.
Abraços calorosos, beijos ardentes e um sorriso encantador na plataforma de uma
estação qualquer. Algo passageiro, uma relação tão efêmera que julgaria não ter
acontecido, não fosse o anel que agora figurava entre as bugigangas de sua
caixa de fotografias.
Talvez aquele rosto fora apenas fruto de um sonho, e como
todos os outros que passavam, era apenas uma máscara. Pensou mais, e agora
apertava o passo. Lembrou-se que já passava da hora, mas não sabia para que. Já
passava das nove da noite. Caminhava ainda em direção à saída.
Chegou, enfim, à avenida principal, onde a estação
descarregava toda aquela massa. As máscaras aumentavam em quantidade. Talvez
também usasse uma. Não sabia ao certo, sabia apenas que era mais um elemento que
compunha aquela grande e densa massa.
Caminhou mais um pouco até que chegou a seu destino... uma
livraria grande e encantadoramente acolhedora. Andou um pouco por entre as
prateleiras, pegou um livro qualquer, não lembrava o que havia ido buscar, sentou-se
em um canto e começou a ler.
Não conseguiu se concentrar por muito tempo. O rosto
misterioso lhe vinha à mente a todo momento. Ficou ali por mais um tempo.
Decidiu levar o livro, não porque a história havia lhe interessado, na verdade,
nem prestara atenção. Mas porque a capa e o título lhe soaram agradáveis.
Saiu dali, e já não lembrava por qual motivo havia ido até lá. Caminhou um pouco pela
avenida. Começava a chover uma chuva que lhe doía o rosto. Percebeu que, assim
como todos à sua volta, usava sim uma máscara. Não se sentiu mal.
Lembrou-se do rosto em meio à multidão. Sorriu. Pensou
naquela noite intensa. Agradeceu por tê-lo perdido em meio à multidão na escada
de embarque. Parou no primeiro ponto de ônibus. Esperou junto à multidão, entrou
no ônibus 103, que o deixaria em casa.
Olhou pela janela, pode ver através dos olhares, pessoas e
seus conflitos internos. Sorriu um sorriso tímido e tristonho. As máscaras haviam
caído, e do rosto, só restavam alguns vestígios.
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