Observou
seu quarto mais uma vez. Fechou a porta, a janela e agradeceu por tudo aquilo.
Mirou o enfeite que decorava o teto e pediu por boas energias. Saiu dali,
passou por cada cômodo. Trancou tudo e esperou o 103 que levava ao centro.
Pegou
o ônibus como quem vai para sua primeira viagem. Não estava só. Sua família
estava ali. E não havia no mundo companhia mais agradável. Não era do tipo que
sai e comemora em um lugar diferente, ao contrário, sua casa era seu refúgio
nessa época do ano.
Entraram
no 103 que levava ao centro e lá foram, em direção ao show de luzes. A viagem
durou cerca de uma hora e meia no máximo. Encontraram uma multidão de pessoas
que, como eles, haviam ido ver à grande queima.
Assistiu
aos shows. Compartilhou abraços com sua mãe, com seu pai. Gritou. Sorriu.
Curtiu. Cada segundo daquele momento estava mágico. Sabia que algo lhe faltava.
Talvez a presença de alguns amigos, alguns colegas. Seguiu a noite como uma
criança.
Com
sua câmera em mãos, fotografou. Olhava ao redor as pessoas. Felizes. Cada qual
com seus sonhos, desejos e realizações. Cada qual com sua esperança. Era uma
multidão gigante que, em poucos minutos, tomava conta da maior avenida da
cidade. Se divertiam. Cantavam. Pulavam.
Ouviu
canções que a tempos não ouvia. Pulou como quem pula em um brinquedo desses de
inflar. Seu olho brilhava como nunca antes. Lembrou-se. Sabia o que faltava
ali. Mesmo distante sabia que sua presença faria a diferença.
Os
minutos iam passando com uma rapidez incrível e, assim, as horas se iam sem
perceber. Dali a alguns instantes, como num passe de mágica, tudo iria começar
novamente. Ao virar do ponteiro, em um segundo, tudo estaria de novo ali, em
branco, esperando para ser escrito.
Havia
chegado a hora. A multidão que tomava conta das ruas se preparava para aquele
momento mágico. Sua família estava ali, vivendo junto aqueles instantes
mágicos.
Tudo
estava perfeito. E como em um passe de mágica números rolaram entre suas bocas.
Contando cada um com firmes gritos de esperança. A cada número solto os olhos
brilhavam mais forte, o coração batia mais acelerado, e o corpo vibrava de
forma nunca antes vista. Era um momento único. Sabia que lhe faltava algo.
Sabia que não estava ali, mas lhe era muito importante.
Palavras
foram ditas, sonhos foram criados e vividos. Muitos sofreram. Muitos sorriram.
E agora era a hora de tudo se iniciar novamente. Um novo ciclo. Novas
oportunidades. Novos caminhos. Novas escolhas. Novos sonhos.
O
povo gritou. O relógio seguiu seu trabalho. O ponteiro se aproximava da tão
sonhada hora. A contagem se iniciou. Famílias se abraçavam. Casais se amavam.
Pessoas curtiam. Ali, em meio a toda aquela multidão, lembrou-se apenas de uma
coisa com a qual gostaria de estar.
Milhões
de pessoas na principal avenida da cidade. Milhões de pessoas dançando,
cantando e contando para a chegada do novo. Mas sabia que queria apenas uma
coisa. E no momento mais esperado, aquele sorriso lhe veio à mente.
O
céu clareou.
O
novo chegou. Tudo parecia sonho. O amor apareceu. Luzes coloriam o negro da
noite. A lua de longe observava. A multidão aplaudia e sorria como nunca. Eram
crianças, milhões de crianças sonhando e desejando crescer e realizar seus
sonhos e serem especiais.
Eram
especiais. Eram humanos. Naquele momento a humanidade apareceu. O amor reinou.
Em seu coração o sorriso de quem tanto amava. Em seus olhos, o brilho das
luzes. Em seu pensamento o amor. Abraçou sua família. Cumprimentou alguns
estranhos. Cumprimentou vidas. Sonhos. Desejos. Cumprimentou a esperança.
O
espetáculo encerrava aquele ciclo tão ruim em sua vida, e dava espaço a novas
experiências. Novos caminhos.
As
luzes brilhavam. A música tocava. A família abraçada. O amor presente em seus
corações. Permaneceu ali, sem que qualquer movimento lhe atrapalhasse.
Permaneceu imóvel por um tempo. Olhando apenas para o céu, agradeceu. Juntou as
mãos. Olhou para o céu. Agradeceu.
Estava
ali, realizava um sonho também.
Aos
poucos a multidão ia se espalhando. Aos poucos a avenida ia ficando com os vestígios
de uma grande festa. Tudo correu bem. Tudo ia bem. Tudo seria bom. Procuraram
algo para comer ou beber. Caminharam um pouco. Tomaram algo. Voltaram para casa
mais vivos do que nunca. Voltou pra casa mais apaixonado do que nunca.
Seguiram
noite adentro. Ao chegar, as luzes ali permaneceram. As luzes ficaram na mente,
como em uma fotografia. No coração, as luzes ficaram, como em um sonho.
Despediu-se
de todos. Desejou-lhes algo. Beijou cada um como se não os visse a muito.
Entrou em seu quarto. Surpresa. As luzes estavam lá. As luzes permaneceram ali. As luzes estavam ali como havia deixado. Mas agora com
mais brilho. Um brilho especial. As luzes na garrafa. As luzes na mente. Em uma
fotografia. Em um sonho.
As
luzes, em sua alma.
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